"Reflexões Pessoais", Nº 30
Em numerosos contextos e discursos um recurso falacioso vem
sendo utilizado: o postulado de que “os anos 70/80/90/2000 eram melhores que
atualmente”.
Tão profundo quanto uma poça d’água.
Se trata apenas de uma nostalgia, que em nada apresenta
fatos que corrobore com tais afirmações. Se eu tivesse perguntado ao meu avô
(caso vivo estivesse), ele diria que os melhores anos foram os 50. Perguntando
aos meu pais, dirão os 70/80. Eu achava os 90. Meus filhos, caso vierem a existir
em médio prazo, certamente considerarão os anos 2020 ou 2030 melhores.
Podemos perceber que sempre existe um padrão em tais falácias.
Normalmente as melhores décadas sãos as que o interlocutor tinha entre 16 a 25
anos, mesmo que naquela época ele não pensasse assim. Você tem 25 anos,
provavelmente quando tiver seus 40 ou 50 dirá aos seus filhos e netos que época
boa era a de 2018!
Mas não se preocupe! Quase todos temos essa visão, pois a
melhor época de nossas vidas é quando temos menos problemas, quando somos mais
idealistas e menos realistas. Um exemplo: hoje em dia você pode receber um
salário 10 vezes maior do que ganhara quando tinha seus 17 anos, mas aos 17 pode
ter sido sua melhor época. Posso ganhar na loteria e ficar milionário aos 40.
Mas mesmo assim, para meus netos direi: "Oh! Época boa era os anos
90".
Só que basta uma análise fria pra toda essa fantasia
desmoronar: Nos anos 50/60 garotas de 12 anos se casavam. Garotos de 12 tinham
que cortar lenha e carregar baldes d’água na cabeça pra tomar banho. Não
existia erotização das crianças, não mesmo: o que existia era procriação. Nossas
avós eram mães com 13, 14 anos (era outra época). Como pode nossas avós virem e
dizerem que “as crianças de hoje estão perdidas?”
Concordo que a educação atual enviesou tão violentamente
para um espectro ideológico específico que hoje as escolas não passam de fábricas
de analfabetos. Antigamente os analfabetos eram feitos em casa, sem gastar
recurso algum dos impostos. Sendo assim, piorou.
Mas não podemos e nem
devemos generalizar. Senão fosse as escolas, mesmo com seu péssimo ensino,
muitos aqui estariam plantando milho sem sequer saber assinar o próprio nome. A
educação é ruim? É. Mas é bem melhor do que a dos anos 70.
Eu não acho que nossos adolescentes estão piores do que os dos anos 90. Contudo
agora com essa era de informações instantâneas, acabamos tendo mais conhecimento
das tolices e ingenuidades desta geração de modo instantâneo.
Eu nos meus 11 anos matava passarinho com um estilingue, e
hoje, não vejo uma criança da mesma idade fazendo algo assim. As besteiras que
fazem mudaram, mas são as mesmas besteiras e traquinagens que toda criança fez
em toda a história.
Na minha época brincava-se de “salada mista”. Então quando vejo um
pré-adolescente dizendo que quer “dar uns pega” na amiguinha, não consigo ver
diferença alguma. Hoje em dia essa galera tem acesso a sites pornográficos no
conforto de suas mãos (literalmente) não vejo diferença alguma quando em meus
12-13 anos juntava com os amigos da mesma idade pra fazer vaquinha e pedir um
maior pra alugar um daqueles “VHS proibidos”. Tão pueril quanto natural essa
curiosidade de moleque.
Outra falácia é que os antigos viviam de forma mais
saudáveis do que hoje em dia, que se come tudo industrializado. Basta analisar
a expectativa de vida das pessoas, que só aumenta a cada geração. Isso sem
falar da altura física, que também está aumentando.
As pessoas das antigas viviam pouco, no máximo chegavam aos
60 anos, e hoje a pessoa com 60 está como se tivesse aos 45 ou 50. Só reparar
que o presidente eleito Jair Bolsonaro já é um “sessentão”, se recuperou de uma
facada, e está aí firme, forte. Dizem que a média atual hoje é de 70 a 75 anos,
mas eu mesmo vejo essa média até mais alta, a expectativa média de vida humana
hoje já pode ser considerada entre 80 e 85 anos. E isso como o passar das
gerações e dos avanços tecnológicos na saúde só tende a aumentar.
Daqui algumas gerações, será comum convivermos com gente
centenária. Eu mesmo acredito que chegarei lá.
Tudo é cíclico, e de certa forma vivenciamos muitas coisas que foram vivenciadas há mais de duas décadas. Ainda continuo tendo enorme carinho pelos anos 90, mas sempre vigilante quanto a torpe lente da nostalgia.